Novo método científico pode baratear custos de produção no futuro
O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Leveduras (INCT Leveduras), com sede no Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, acaba de realizar uma clonagem importante. Os cientistas do grupo que atua na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) conseguiram produzir uma cópia da enzima transglutaminase (TGase) recombinante. Inicialmente, o objetivo foi desenvolver uma levedura - similar às que se usam na fabricação do pão ou da cerveja - para produzir a enzima TGase.
Esta enzima é importante na fabricação de derivados de proteínas animais, tais como embutidos, laticínios, novas proteínas vegetais e pães. A levedura escolhida para a clonagem é a Pichia pastoris, conhecida por sua segurança e versatilidade metabólica. A indústria brasileira praticamente importa toda a TGase de que necessita e a criação desse novo sistema biológico (levedura e clonagem) poderá baratear os custos de produção desses alimentos no futuro.
A ideia original de clonar a TGASE em Pichia é do grupo BiotecLab, coordenado pelo professor Marco Antônio Záchia Ayub e sua orientanda de pós-doutorado Lovaine Duarte. Em seu trabalho de doutorado, ela caracterizou a TGase de Bacillus sp. que, agora, é o objeto de estudos neste projeto.
No INCT Leveduras, coordenado pelo biólogo Carlos Rosa, titular do Departamento de Microbiologia do ICB UFMG, o grupo do professor Ayub é responsável por caracterizar e selecionar leveduras com capacidade de fermentar os principais açúcares constituintes de matérias-primas agroindustriais, que apresentem alta capacidade de produção de enzimas e outras biomoléculas. O objetivo é criar produtos fermentados inovadores para aplicação nas indústrias farmacêutica, biotecnológica e de alimentos.
Os experimentos que levaram à clonagem da TGASE na Pichia foram desenhados pelo professor Diego Bonatto, do Departamento de Biologia Molecular e Biotecnologia da UFRGS, com a participação da bióloga Isabela Sfalcin, bolsista de Iniciação Científica.
“Conseguimos inserir na levedura Pichia pastoris (Komagataella phaffii) dois genes sintéticos para a expressão da TGase proveniente de Bacillus sp. Como a TGase é uma proteína que pode ser tóxica para a levedura, foi desenvolvida uma forma de colocar a TGase na superfície da célula da levedura e, dessa forma, evitar que a enzima mate a célula. Também clonamos um sistema para expressar a TGase, tanto na superfície da célula, quanto em em uma organela muito abundante nesta espécie de levedura chamada peroxissomo, e que tem sido usada para a expressão de proteínas tóxicas mais complexas de manejar, como é o caso da TGASE”.
Para o professor Bonatto e para Duarte, o principal desafio foi estabelecer uma técnica rápida de transformação da levedura. “Foram aproximadamente seis meses para desenvolver procedimentos mais confiáveis para descobrir se as células de Pichia pastoris estavam com os genes para a TGase”. Para isso, eles simplificaram os meios de cultura usados para a obtenção das leveduras transformadas, tornando a seleção das colônias mais rápida.
O trabalho do grupo não é de todo inédito, mas uma adaptação de procedimentos já usados por outros pesquisadores. “Existem vários grupos tentando expressar TGase de diferentes organismos em Pichia pastoris”, mas a novidade, de acordo com o Bonatto, é que “em todos os casos, o rendimento de TGase obtido é muito pequeno, o que impede a sua produção e seu escalonamento industrial”.
A próxima etapa, relata o professor Ayub, coordenador do projeto, é iniciar as pesquisas de expressão, produção, purificação e aplicação da TGASE em sistemas alimentícios. Os trabalhos serão realizados em biorreatores e contarão com a participação de outro bolsista do INCT Leveduras, Vitor Galante.
A transglutaminase (TGase) é uma enzima de importância industrial e a sua produção em leveduras é um desafio. A sua clonagem em Pichia pastoris usando genes sintéticos com características inovadoras pode abrir espaço para a produção de outras enzimas e proteínas de difícil expressão, mas que tem apelo industrial ou terapêutico.
Com trabalho na área de Biologia Sintética e de Bioprocessos, o INCT Leveduras inclui pesquisadores de mais de dez regiões do Brasil e tem como principal objetivo gerar conhecimento sobre as leveduras da biodiversidade brasileira e, a partir do estudo desses microrganismos, promover inovações biotecnológicas consideradas estratégicas para o desenvolvimento sustentável.
Reportagem: Dayse Lacerda